Eu gosto muito de usar ternos, mas eu odeio usar ternos. Eu sei, parece uma contradição. Não é. Explico.
Eu sinto muito calor, por isso adoro o frio. Acho que nasci no lugar errado. Como escreveu Chico Buarque:
Deus é um cara gozador, adora brincadeira
Pois pra me jogar no mundo, tinha o mundo inteiro
Mas achou muito engraçado me botar cabreiro
Na barriga da miséria nasci brasileiro
Eu sou do Rio de Janeiro
Na verdade, nasci e moro em Vitória, mas o calor é praticamente o mesmo…
No dia-a-dia, usar ternos é muito desconfortável, com gravata, então, nem se fala. Mas o pior é ver as partes em audiências, por exemplo, com roupas mais confortáveis. Aliás, os servidores que trabalham em fóruns raramente são vistos de ternos, o que torna a exigência para os advogados um tratamento incoerente. Faça o que eu digo, não o que eu faço.
E mais: as mulheres podem usar roupas leves ou mais frescas, como saias e blusas que expõem os braços. Em uma época de igualdade de gêneros, isso me parece discriminação, mas isso é outra história…
A simbologia da vestimenta é conhecida e se manifesta em diversas tradições, como a roupa dos noivos e das festas culturais. Nas profissões, além dos advogados, outras profissões também têm sua simbologia e tradição de vestimentas, como os médicos (se bem que a roupa branca tem a função específica de destacar a sujeira por questões sanitárias) e os militares.
Mas tradições também desaparecem. A realidade que deu origem às tradições muda e a tradição perde sua razão de existir. As perucas usadas pelos advogados e juízes ingleses já não é mais usada em casos civis desde 2007. E olha que a Inglaterra é um país conhecido pela formalidade…
Aliás, um parêntese: as sociedades inglesas de advogados já podem ser constituídas na forma de sociedade anônimas e receber investimentos de não advogados. É a nova realidade mudando as regras.
Além da simbologia, das tradições e das questões climáticas, as roupas também fazem parte da identificação de grupos sociais. Os adolescentes são um ótimo exemplo: sempre procuram usar as roupas que os identificam com os grupos com que mais se identificam.
Como atuo como consultor jurídico para empresas, ao utilizar roupas mais comuns consigo muito mais empatia com meus clientes — os empresários. O terno, ao contrário, cria um distanciamento que apenas prejudica essa relação.
E quanto ao amor pelo terno? Acho o terno uma roupa muito elegante, especialmente os feitos sob medida. Nas ocasiões em que uso, me sinto muito bem e as pessoas nos tratam melhor; não vou negar que isso acontece e ser bem tratado é sempre muito bom! Apenas não abro mão do meu conforto…
* Vinicius Assis é um dos Fundadores da Fass